terça-feira, 20 de outubro de 2009

As empresas e a política

Artigo
O cidadão deve ser consciente de sua importância no processo empresarial e na definição dos rumos do País.


Já faz alguns anos que participo de entidades empresariais , como membro, conselheiro ou apenas palpiteiro. São três décadas de militância, com um discurso que  agora começa a encontrar eco, embora muitas vezes eu tenha chegado a  desanimar pela falta de interesse por parte  das grandes corporações empresariais em ouvir, assimilar e praticar.
Ou tudo isso ao mesmo tempo.
Refiro-me à tese que defendo de que as empresas não podem, em suas formulações estratégicas e na formação e qualificação de seu pessoal, deixar de  fora as considerações sobre  o ambiente em que atuam  no País, ou seja, o que se refere à questão política.
Cansei de ver cara de espanto em altos executivos  e em empresários , quando em palestras (e já são mais de mil nesse período) , eu dizia que a empresa, além de qualificar técnica e administrativamente seus colaboradores, deveria lhes dar também qualificação política. A importância de todos os níveis hierárquicos de uma empresa conhecerem a vida institucional e  política do País,  é tão fundamental  quanto  sua capacidade competitiva.
A saída mais fácil  foi sempre algo assim: nossa empresa não se mete em política.  Expus à exaustão,  para esse público, que por mais eficiente que uma empresa seja em seu negócio, em operar seu "business core", ela tem de conhecer e participar do ambiente externo que influencia  seus negócios. Muitas vezes, um negócio fracassa, ou deixa de ser competitivo e as razões são procuradas internamente, quando estão no ambiente externo, como decisões  de política econômica, reflexos de crises nacionais e internacionais, leis que afetam o setor e outras.
Quando abordo o assunto, deixo claro que não se trata de inserir a empresa e seus colaboradores num partido político, engajá-los numa campanha ou algo assim. Essa decisão é individual,  no exercício de sua cidadania. À corporação cabe , porém, preparar seus funcionários, gerentes, diretores, operários, para serem cidadãos conscientes do mundo em que empresa vive, das influências que decisões individuais (somadas)  podem determinar à vida da organização e à  de cada um que nela trabalha.
Com medo de mostrar opinião ou posição política e sofrer represálias ou perder  contatos privilegiados, as empresas acabam deixando ao vento a formação política de seus quadros e  estes, com a influência que recebem externamente, sem ter consciência plena do papel da empresa na vida brasileira  e dele dentro da empresa, num país de regime de livre  mercado ,acabam não tendo ideologia que signifique a sobrevivência de sua carreira, de seu emprego, de sua empresa.
Felizmente, começo a ver,  aqui e ali,   mudança comportamental de grande importância para a melhor adequação da empresa privada no contexto político do poder e da sociedade brasileira. Os tabus devem começar a cair e   as empresas entenderem que se em seus objetivos e planos estratégicos, não considerarem as variáveis externas da vida política, econômica e social do país, sempre serão margem de manobra de políticos carreiristas.
 Não basta contratar consultores para  palestras ou lobistas para andar por Brasília e adjacências dos poderes públicos. É preciso criar em cada cidadão a consciência de quem ele é, onde está,  sua importância no processo empresarial e na definição dos rumos do País, por meio do voto. É preciso mostrar  como funciona o acesso ao poder,  via partidos políticos.  As decisões, depois, caberão a cada um.
Vejo entidades de peso sistematizando as influências internas e externas nas avaliações de participação empresarial no mercado e na vida do Brasil. Está mais do que na hora de o elefante saber  sua força, influenciar nas decisões do circo, deixar de lado as vaidades pessoais, a competição por luzes entre lideranças, e a livre iniciativa brasileira passar a entender que ela é  definida na Constituição como base de nossa atuação econômica. E a liberdade de empreender, pensamento e investimento, são a base.
Não podem e não devem submeter-se ao Estado, e sim, devem e podem formar as lideranças que amanhã estarão em cargos importantes, definindo a direção a tomar,  e não se deixando sugar por políticos mal formados que sugam a energia produtiva das empresas, dos trabalhadores, em benefício de causas pessoais.
Vindo de uma reunião empresarial, onde este tema começou a ser aprofundado, posso dizer que senti  meu entusiasmo recuperado, a esperança de que a inteligência volte a ter vez,  para se contrapor à manipulação emocional e à exploração da pobreza e da ignorância.

Paulo Saab é jornalista e escritor
Publicado no jornal Diário do Comércio



Nenhum comentário: